O quarto artigo da coluna mensal na Vida Económica aborda a herança – um solo riquíssimo para conflitos. Saiu no suplemento Vida Judiciária da Vida Económica de 29 de outubro de 2021 e na versão online.


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Coluna sobre Mediação de Conflitos – n.º 4
Por Silke Buss, Mediadora de Conflitos, Especialista em comunicação

Mediação de conflitos
A guerra jurídica entre mãe e filha pela herança de 500 milhões de euros

Peter Dussmann era o arquétipo de um self-made man. No início dos anos 60, em pleno Milagre do Reno, o alemão teve a ideia genial de disponibilizar um serviço de limpeza para homens que, devido ao trabalho, viviam longe da família. Desta ideia fez um negócio e do negócio criou um império. Quando faleceu em 2014, deixou um conglomerado multinacional com um volume de negócios superior a 2 mil milhões de euros e mais de 60.000 colaboradores e colaboradoras. Pouco depois, em 2015, rebentou a feroz guerra jurídica entre a viúva Catherine e a única filha do casal, Ângela, pela herança. Será que Peter Dussmann, hospitalizado e muito limitado devido a um grave AVC, foi mentalmente capaz de alterar o seu testamento em 2010? Catherine, hoje de 70 anos, alega que, num momento lúcido, o marido tinha apontado para ela e dito “tudo, tudo”. Depois de ter confirmado a vontade do marido, mandou alterar o testamento de 1981 em que o empresário tinha definido partes iguais para Catherine e a filha que estava a caminho. A nova versão que o doente veio a assinar determina, contudo, 75 por cento para Catherine e 25 para Angela, a quota legítima, e afasta a filha da empresa.

Desde então, há seis anos, mãe e filha debatem-se arduamente, com advogados de topo e agências de comunicação de renome, num litígio complexo com queixas, recursos e alegações escritas de centenas de páginas. Para quê?

O que leva uma mãe a processar a própria filha e uma filha a processar a própria mãe? Será a vontade de assegurar a continuação próspera do império do pai e de conquistar a maior fatia possível do tesouro de conto de fadas estimado em 500 milhões de euros, com um castelo de água na Baviera e outros imóveis de sonho, um jet privado, relógios preciosos e moedas de ouro?

Um tribunal não é capaz, nem é a sua função, de curar as feridas que as duas mulheres se causaram mutuamente, como a escolha de um marido 17 anos mais velho com a sua própria doutrina esotérica, por exemplo, a ausência dos pais no casamento ou a prenda enviada por correio com velhas coisas da juventude da filha e uma mensagem interpretada por ela como cínica. Ataques sobre ataques, mágoas sobre mágoas. Pessoas em conflito costumam perder a capacidade de interpretar de forma racional, de relativizar, de comunicar e de encontrar soluções. Na mediação, finalmente, há espaço e tempo para tudo isso. A mediação oferece o enquadramento e as regras ideais para que as pessoas em conflito falem e se escutem mutuamente sem se magoar. O mediador ou a mediadora cria um ambiente propício para conseguirem desenvolver uma solução para o seu conflito e mais: prepara o terreno no qual podem criar uma nova relação saudável de amor, reconhecimento, compreensão e confiança.

Espero muito que Catherine e Angela tenham juízo para ir por esse caminho. Enfim, não vamos ficar a saber, já que a mediação é confidencial.