Coluna sobre Mediação de Conflitos – n.º 8
Por Silke Buss, Mediadora de Conflitos, Especialista em Comunicação
Prevenção e Mediação de conflitos
A história de um juiz frustrado que preferiu ser mediador
A influência alemã no direito português é conhecida. É transversal e abrangente. Vai desde a constituição até ao código civil. No entanto, também há diferenças cruciais nos princípios e na aplicação. Um exemplo é o papel dos juízes e das juízas nos litígios alemães. A sua atitude é construtiva, procuram incentivar o mútuo-acordo entre as partes e isso dentro e fora da sala de audiências. Lembro-me dessa prática que conheci aos vinte anos quando fui estagiária do diário alemão de Colónia e acompanhei alguns processos em tribunal. Tenho uma viva memória das conversas do juiz nos intervalos. No bar do tribunal, ele ia buscar cafés ao balcão para toda a gente, para os advogados e as advogadas das diferentes partes (e para nós jornalistas), incentivava debates mais informais e, por vezes, sensibilizava para soluções que ele próprio imaginava e achava justas. Fiquei impressionada. Ainda mais impressionada fiquei décadas depois, em 2013, quando soube que o meu docente do curso de mediação, o grande mediador Arthur Trossen, antes juiz no tribunal de família, tinha arrumado a toga precisamente pelas limitações do cargo. Ao longo dos 12 anos em funções sentiu-se cada vez mais frustrado porque, para além de explorar ao máximo a possibilidade de estimular o mútuo-acordo, achava que as suas sentenças não contribuíam para o verdadeiro bem-estar das pessoas envolvidas porque não resolviam os conflitos. Por isso, queria ser mediador para ajudar os casais divorciados, os seus filhos e filhas a encontrarem uma solução com que todos e todas pudessem viver e conviver no futuro, para encontrarem uma verdadeira paz familiar.
Em 1996, especializou-se então em mediação de conflitos e encontrou a sua verdadeira missão. Como mediador podia ir muito mais longe do que enquanto juiz. Podia fazer perguntas profundas e puxar, pouco a pouco, para a superfície as verdadeiras necessidades, os desejos, medos e bloqueios das pessoas envolvidas. Contou um caso curioso: Um pai divorciado queria levar a filha de oito anos, que vivia com a mãe, a umas férias nas Maldivas – juntamente com a nova namorada. A ex-mulher era estritamente contra e disparou uma série de argumentos no início da mediação: que era uma viagem perigosa, que a menina podia apanhar queimaduras solares e uma gastroenterite, etc., etc. Ao longo da mediação, as perguntas do mediador levaram-na a reconhecer que tinha ciúmes. Com ela, o ex-marido nunca tinha ido a um destino de sonho! Eis o ponto de viragem naquela mediação. A partir daí, o pai e a mãe conseguiram focar-se no positivo e encontraram uma solução original win-win-win: Juntaram-se e foram às Maldivas. Como?! Sim, o pai levou a namorada, a filha e a ex-mulher. A mãe sentia-se feliz por finalmente passar férias num destino maravilhoso e por poder estar próxima da filha. O pai gostou porque podia levar a filha e ainda poder ter programas românticos com a namorada por levar uma “baby-sitter”. E a filha ficou nas nuvens por passar férias com a mãe e o pai.