Por vezes é tarde para fazer as pazes. O 35.º artigo da coluna “Prevenção e Mediação de conflitos”, assinada por Silke Buss, aborda um conflito entre dois homens de negócios, pai e filho. Saiu na Vida Económica de 31 de maio de 2024.
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Prevenção e Mediação de conflitos
O longo abraço de reconciliação do filho ao pai
“As coisas estão a correr de forma mais civilizada”, respondeu. As suas unhas contaram-me outra história. No último almoço, ainda estavam saudáveis. Ao registar o meu olhar, confirmou que tinha voltado a roer as unhas e que o conflito com o pai mexia de tal forma com ele que dormia mal e entrava triste na empresa familiar a cada manhã. O conflito persistente estava agora mais subtil, disse, o que era ainda mais doloroso. Tentei mais uma vez convencê-lo a procurar uma competente mediadora ou um bom mediador para finalmente resolver as profundas divergências com o pai. Não podia ser eu, já que sou amiga da família há décadas e conheço muito bem os dois.
Como é possível essa relação amor-ódio? São dois homens de negócios, inteligentes, bem-sucedidos, carismáticos e seguros, com imensa cultura geral, experiência internacional e uma bela vida. O que faz um pai a interpretar o seu único filho como concorrente? A negar-lhe qualquer reconhecimento? E pior ainda: a degradar e ridicularizar o seu jovem sócio em frente de toda a direção? Claro que o velho empresário, na verdade, estava cheio de orgulho pelo filho. Elogiava-o até aos céus em conversa comigo a sós, no seu gabinete, durante um almoço ou por telefone. Também o criticava, mas de uma forma generosa, com o carinho de um pai que só quer o melhor para o seu filho. Este comportamento ambíguo causa-lhe estranheza? A mim também. Perguntei-me: Como um homem inteligente e intelectual pode ser tão incapaz de estabelecer uma relação saudável com o filho? Como pode ser tão cego quanto ao sofrimento dele? A triste verdade é que este relacionamento ambivalente acontece com frequência entre pais/ mães e os seus filhos/ filhas. Resultam de padrões adotados e não refletidos da própria educação.
É sempre melhor refletir antes de atuar, mas, quando os padrões já estão em funcionamento automático e causaram danos, a solução ideal é realizar uma mediação. E quanto antes melhor, já que o caminho da aproximação corresponde a o do distanciamento, ou seja, vai haver muito trabalho para as pessoas em conflito durante as cinco fases de uma mediação. A mediadora ou o mediador conduz, ajuda e orienta, mas são elas que têm de ouvir, explicar, repensar, reformular, refletir e encontrar a solução para conviver no futuro em paz. Na mediação vão ser confrontadas com realidades negadas e vão sentir emoções suprimidas. Vão ganhar consciência de tudo que fizeram mal e que poderiam ter feito melhor. Mas depois, felizmente, vem a quarta fase da mediação e, de um momento para o outro, tudo parece fácil. Que alívio! Que inspiração! Agora sim, conseguem compreender as necessidades uma da outra. Agora tudo é possível, há tantas soluções. É só sugerir mutuamente e escolher as melhores em conjunto. No fim, é tudo assente ao pormenor no acordo de mediação.
Quanto ao conflito dos meus amigos, imagino, no fim da mediação, um grande e longo abraço entre pai e filho. Infelizmente, não aconteceu. O pai morreu antes. No entanto, há pouco, cinco anos depois, houve um momento surpreendente de reconciliação. Pela primeira vez, o filho incluiu o seu pai, com carinho e reconhecimento, num discurso público.